Popularização da ciência do solo voltada para a transformação social

Popularização da ciência do solo voltada para a transformação social

Instituições paranaenses ampliam  iniciativas de Educação em Solos entre professores e alunos do ensino básico

A popularização da Ciência do Solo avançou muito nas últimas décadas no Paraná, mas tornar acessível o conhecimento científico ao cidadão leigo consiste em um desafio diário enfrentado pelas instituições de ensino e pesquisa. Mais do que transpor o conhecimento científico em linguagem de fácil compreensão ao público alvo, a popularização da ciência do solo deve ser, também, um ato político voltado para transformação social.

Como sociedade científica, o Núcleo Estadual Paraná da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (NEPAR) se ocupa também da popularização da ciência do solo. “Um dos problemas que detectamos é que a população em geral conhece muito pouco sobre o solo. Esse desconhecimento sobre a importância deste elemento natural torna mais difícil a difusão de boas práticas de manejo e conservação, tanto de solos urbanos como de solos rurais”, enfatiza a diretora do NEPAR, Nilvania de Mello, professora da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), de Pato Branco.

É importante lembrar que processos como erosão, contaminação, perda de funções ocorrem tanto no campo quanto na cidade. “Outro aspecto que temos buscado enfatizar é que atualmente mais de 70% da população do estado do Paraná reside no meio urbano”, destaca Nilvania, acrescentando que são essas pessoas, esses cidadãos que votarão nas eleições, que defenderão ou não políticas públicas em prol da conservação ambiental e consequentemente do solo. “Por isso a popularização da ciência do solo, e a educação em solos são tão importantes”, complementa.

Nas últimas duas décadas, um grupo de docentes do Departamento de Solos e Engenharia Agrícola da Universidade Federal do Paraná (DSEA-UFPR), insatisfeitos com a educação em solos no ensino fundamental e médio, lançaram o  Programa Solo na Escola.

“Como programa de extensão universitária, o Solo na Escola entende que a extensão é uma via de duas mãos onde contribuímos para a transformação social, ao mesmo tempo em que a própria Universidade é transformada e qualificada neste processo”, explica o professor Marcelo Ricardo de Lima, coordenador do Programa de Extensão Universitária Solo na Escola/UFPR-Curitiba.

Segundo ele, o Programa procura se apoiar em alguns grupos de ações, que compõem os projetos vinculados: a) Exposição didática de solos, enquanto espaço expositivo, de popularização científica, mas também de desenvolvimento e testagem de tecnologia educacional; b) Formação inicial e continuada de professores da educação básica, nas modalidades presencial, híbrida e EaD; c) Educação ambiental, especialmente vinculada a ações de grande impacto no uso do solo; e d) produção de material didático, como cartilhas, vídeos, livros, banners e mapas, no intuito de ampliar o alcance das experiências desenvolvidas no Programa.   

A boa notícia, diz o professor Marcelo, é que muitas ideias, concebidas pelo Programa e outras ações de Educação em Solos pioneiras, foram abraçadas por outras instituições de ensino, pesquisa e conservação ambiental e, atualmente, há quase uma centena de iniciativas de educação em solos espalhadas pelo país. No estado do Paraná, por exemplo, há iniciativas de educação em solos na UENP-Cornélio Procópio, UNIOESTE-Marechal Candido Rondon, UTFPR-Medianeira, UFPR-Jandaia do Sul, UFPR-Litoral, entre outras instituições.   

“Entretanto, embora exista quase uma centena de iniciativas, ainda estamos bem aquém do que seria necessário para abranger um país de dimensões como o Brasil”, avalia o professor.   

Entre as atividades desenvolvidas por essas iniciativas, nos últimos dois anos, foram lançados livros infantis, buscando explicar, por exemplo, as funções do solo ou seja para que serve, o que é degradação, biodiversidade, entre outros temas relacionados.

“Essas obras infantis são uma forma de popularizar o conhecimento, de veicular as informações, fazendo a transposição didática de algo mais técnico para algo acessível. Quando fazemos essa releitura, já estamos direcionando isso para um público leigo, no caso as crianças”, afirma a professora Jully Gabriela Retzlaf de Oliveira, da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP), Campus Cornélio Procópio, onde coordena o Projeto Solo na Escola/UENP.   

Em contrapartida, a docente destaca a importância de levar o conhecimento do solo a qualquer público, de qualquer idade.  “Uma vez que o indivíduo toma conhecimento do solo como componente natural que interfere em vários processos ecológicos, ele passa a ser um agente transformador que contribui para a manutenção do solo”.

Visita de grupo de alunos da educação básica na Exposição Didática de Solos da UFPR em Curitiba (PR)

Conhecimento gera poder

O grande trunfo da popularização da ciência é que, a partir do momento em que o indivíduo obtém conhecimento de algo que desconhecia, ele passa a ter poder, especialmente em decisão da sociedade, define a professora Jully Retzlaf.

“Quando concebemos que o conhecimento é poder, ao fazermos atividades de popularização, estamos dotando o indivíduo leigo (entendendo que leigo é aquele que não é da área) de poder”, afirma.

O mais interessante da popularização, na avaliação da professora, é a tomada de consciência sobre determinado fato e situação cientifica.   “O indivíduo passa a adquirir noções que permitem agir na sociedade, enquanto ser que vai pensar e influenciar nas políticas públicas, por exemplo, a partir daquele conhecimento adquirido”, afirma a professora Jully.   

Um exemplo bem simples, citado pela professora Jully, diz respeito ao uso de agrotóxicos. “Quanto mais a gente conscientizar o indivíduo do impacto que o agrotóxico traz ao meio ambiente, mais conhecimento ele terá para agir plenamente na sociedade em que vive, participando de situações decisórias, se posicionando sobre as políticas que envolvem o tema”.

Ensino básico requer mudança nos métodos

Visita de grupo de professores da educação básica na Exposição Didática de Solos da UFPR em Curitiba (PR)

No Brasil, atualmente, o ensino de solos é voltado principalmente para o ensino superior, e pouco trabalhado no ensino básico. Na opinião dos docentes, observa-se uma escassez e até ausência do conteúdo sobre solos nos livros didáticos.

O professor Marcelo Ricardo de Lima, da UFPR, coordenador do Programa Solo na Escola/UFPR-Curitiba, observa que, em grande parte, os docentes das escolas e colégios, públicos e privados, têm evidentes deficiências em sua formação inicial em relação ao tema solos.

“Às vezes este tema até é abordado em seus conteúdos programáticos, mas com evidente tendência para o bacharelado e não para a licenciatura. Então o professor recebe o conteúdo, mas não sabe como abordá-lo em sala de aula”, avalia o professor, lembrando que, outras vezes, o solo nem é abordado em nenhuma disciplina durante toda a graduação e, assim, o conhecimento dos professores sobre o tema limitam-se ao senso comum.

Aliado a isto, as estruturas curriculares do ensino fundamental e, principalmente do ensino médio, não privilegiam a abordagem deste tema nas escolas e colégios. “Muitos livros didáticos disponíveis, tanto na rede pública quanto privada, abordam o solo com informações desatualizadas, descontextualizadas da realidade nacional ou local, distanciando ainda mais os alunos e os professores desta temática”, enfatiza.

A professora Vanda Moreira Martins, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus Marechal Candido Rondon, que coordena o Projeto “O Solo na Escola” desde junho de 2017, afirma que as dificuldades para ensinar os conteúdos sobre solos estão diretamente relacionadas à algumas variáveis básicas identificadas durante o período de desenvolvimento do projeto.

Entre elas, a formação do professor não contempla o rol de conhecimentos específicos sobre alguns conteúdos ensinados nas séries do ensino básico, o que exige que ele desenvolva habilidades autodidatas. Entretanto, isso demanda tempo e dedicação na forma de carga horária de trabalho, o que frequentemente sobrecarrega o professor.

Segundo a professora, as escolas carecem de espaços adequados e de materiais didáticos temáticos sobre solo. “O aluno precisa entrar em contato com o objeto de estudo, neste caso, o solo. O encantamento e o entusiasmo por aprender é uma condição indispensável nesse processo e as atividades práticas e lúdicas fornecem a condição adequada para compreender e aprender os conteúdos abordados”.

Vanda explica que as atividades desenvolvidas no projeto são pautadas na interação e troca de experiências entre a comunidade universitária e a escolar (ensino básico público e privado), por meio de atendimentos na modalidade tutorias (aulas), oficinas, minicursos, palestras etc., com apoio das práticas pedagógicas diferenciadas relacionadas ao ensino do solo.

Desde a implantação do projeto de extensão permanente em 2017, a equipe realizou atendimentos em vários municípios da região Oeste do Paraná. “Em todas as modalidades de atendimentos (tutorias, oficinas, minicursos e palestras) o público atendido (até o ano de 2021) passa de 2000 participantes entre professores e alunos das redes pública e privada, além da comunidade acadêmica”.

Crianças se encantam ao vivenciar na prática as pesquisas de solo no IDR-PR

O projeto Popularização da Ciência do Solo no IDR-Paraná iniciou em 2017 no Polo de Pesquisa e Inovação de Santa Tereza do Oeste, com a recepção ao longo do ano de grupos de estudantes e professores da educação infantil e do ensino fundamental, das Escolas Municipais deste município.

De acordo com a pesquisadora do IDR-Paraná, Maristela Zanão, que coordena o projeto, em 2019 foi firmada parceria com a Pós-Graduação em Engenharia de Energia na Agricultura da UNIOESTE-Cascavel por meio do pesquisador do IDR-Paraná e professor colaborador da UNIOESTE, Luiz Antônio Zanão Júnior.

Os alunos da pós-graduação transmitem os conhecimentos sobre solo para os alunos da educação básica. “Os alunos participam de atividades didáticas (oito estações temáticas) onde conhecem como o solo é formado, algumas de suas características, sua importância na produção de alimentos e técnicas para sua conservação. Assistem a vídeos sobre solos e participam de visitas guiadas”, explica a pesquisadora Maristela.

Os alunos também participam de “um parabéns” ao aniversariante (solo) e de atividade lúdica com tintas elaboradas com solos do estado do Paraná, com paleta de cores que vão de cinza, rosa, alaranjado, amarelo e vermelho. “Para estimular a conservação do solo precisamos conhecê-lo”, acrescenta a pesquisadora.   

“No meu ponto de vista, o maior feito desse projeto é o encantamento das crianças em vivenciar na prática as pesquisas desenvolvidas pelo Instituto. E até hoje, quando encontro as professoras e as crianças, elas comentam o quanto foi uma experiência que marcou quem participou”, diz Maristela.

FAPA aposta em rally para divulgar as boas práticas agrícolas

Rally estimula as boas práticas, mostrando diversas técnicas que ajudam a preservar a capacidade produtiva do solo

Além das iniciativas de ensino de solos desenvolvidas por instituições e universidades paranaenses, outras ações de popularização da ciência do solo são realizadas por empresas públicas e privadas no estado do Paraná. O Rally de Uso e Conservação de Solo é uma das ações que vêm dando bons resultados há cinco anos, na região de Guarapuava.

Desenvolvido pela Fundação Agrária de Pesquisa Agropecuária (FAPA), entidade instituída pela Cooperativa Agrícola Agrária, o Rally é uma atividade inusitada e divertida para falar de boas práticas na agricultura.

“Além de promover um dia de entretenimento e integração entre os produtores rurais, o rally estimula as boas práticas de agricultura, mostrando diversas técnicas que ajudam a preservar a capacidade produtiva do solo”, explica o engenheiro agrônomo Rodrigo Ferreira, pesquisador responsável pela área de Inovações Tecnológicas e Mecanização Agrícola da FAPA.

Em um trajeto de cerca de 180 quilômetros de estradas rurais, cruzando as regiões como Guarapuava, Pinhão e Candói, os participantes passam pelas propriedades rurais que desenvolvem a agricultura conservacionista.

“Em cada propriedade há uma estação com um engenheiro agrônomo ou pesquisador da FAPA, que vai falar sobre a conservação ambiental no campo e apresentar o que está sendo desenvolvido pelo produtor rural”, explica Rodrigo Ferreira.

A ideia, diz ele, é que os participantes levem para o dia a dia de suas propriedades as lições aprendidas durante o rally e passem a aplicar esse aprendizado nas suas propriedades.   

No primeiro ano de evento somente produtores cooperados da Agrária participaram da competição, mas no segundo ano houve interesse de outros produtores não associados à Agrária e, como o limite é de 40 veículos, a organização abriu o evento para o público em geral.   

Rodrigo conta que a FAPA e a Cooperativa Agrária buscavam um meio para divulgar as boas práticas que vinham acontecendo nas propriedades de seus cooperados. “O problema era a logística, mas aí surgiu a ideia do rally”, diz ele, informando que foi contratada uma empresa especializada em rally que deu todo suporte como, rastreamento de aplicativos de veículos, navegadores, criação do roteiro.

Sanepar recupera manancial e faz dia de campo de manejo de solo e água

Entre os vários programas e ações de educação ambiental que a Sanepar desenvolve no Paraná , a recuperação do rio Piava, ocorrida recentemente em Umuarama, é um bom exemplo de popularização da ciência do solo.

O projeto de recuperação do manancial foi realizado em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR).

A conservação da água perpassa pela conservação do solo. No mês de junho foi realizado o Dia de Campo – Manejo de Solo e Água, em que foram apresentadas as ações do projeto. O Dia de Campo reuniu profissionais, estudantes e produtores rurais do entorno do rio Piava, que abastece a população de Umuarama.

As ações de recuperação foram desenvolvidas durante 13 meses, em 45 propriedades rurais que compõem a Área de Proteção Ambiental do rio Piava.

Ações do IDR-Paraná são voltadas ao agricultor familiar

O Coordenador Estadual de Recursos Naturais e Sustentabilidade na Extensão Rural, do Instituto de Desenvolvimento Rural (IDR-Paraná), Richard Golba, destaca que as principais ações desenvolvidas pelo órgão para popularização da ciência do solo estão no eixo dos serviços de Pesquisa e Extensão Rural prestados à sociedade.

“A extensão rural por definição é um processo educativo não formal de caráter continuado. Nessa perspectiva o IDR-Paraná atua fazendo extensão rural pública em todo o território paranaense, tendo como público preferencial os produtores rurais e suas famílias”, explica Golba, acrescentando que a estruturação do Plano de Ação ainda está em fase de construção por um grupo de participantes das várias instituições convocadas pelo Decreto 11.300, do Governo do Paraná.   

Com foco na agricultura familiar, segundo ele, na dinâmica de execução dos planos municipais é imprescindível a articulação para o envolvimento das lideranças municipais, das cooperativas e associações de produtores rurais, dos agentes de crédito, das instituições governamentais municipais e estaduais principalmente as prefeituras, e outros atores com interesses no ambiente rural.

“O solo é o recurso natural fundamental para a existência da vida no planeta, incluindo a vida humana. Portanto, é o recurso basilar para a existência da agricultura e do agricultor, é o centro do nosso trabalho como profissionais das ciências agrárias com atuação em extensão rural e pesquisa agropecuária. E o objetivo é levar cada vez mais conhecimentos e motivar boas atitudes para o uso cuidadoso desse recurso precioso”, resume Golba.

Antes da incorporação da Emater, Iapar, Codapar e CPRA para a criação do IDR-Paraná, as instituições atuavam com diretrizes próprias, sendo que as ações integradas ocorriam em situações ocasionais. “Agora, na nova condição de uma instituição unificada, estamos na etapa da integração e construção de um planejamento integrado entre as coordenações estaduais da extensão e da pesquisa”, explica.

Fotos/divulgação: UFPR, IDR-Paraná, FAPA, Sanepar

VBcomunicação – assessoria de imprensa

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