Algumas já enfrentaram preconceito, mas luta pela igualdade de direitos permitiu às mulheres carreiras tradicionalmente ocupadas por homens
Historicamente, a ciência sempre foi vista como uma atividade realizada por homens e foi somente após a segunda metade no século XX que ocorreram mudanças neste cenário por conta da necessidade crescente de recursos humanos para atividades estratégicas, o movimento de liberação feminina e a luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres. Tudo isso permitiu a elas o acesso, cada vez maior, à educação científica e a carreiras, tradicionalmente ocupadas por homens.
Quase 70 anos depois, qual o papel da mulher na evolução do ensino, pesquisa e extensão da Ciência do Solo? Para a professora Associada da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Cascavel, Mônica Sarolli Silva de Mendonça Costa, a contribuição das mulheres em todas as linhas de pesquisa é o resultado da dedicação e comprometimento e isso só poderá contribuir para a evolução do tema.
“Eu acredito que a participação das mulheres engrandece a área de pesquisa. A diversificação do ponto de vista feminino sobre as distintas questões que envolvem o tema contribui para o crescimento”, explica Mônica, acrescentando que a difusão de cursos na área de solos auxilia no incentivo à participação.
Mas o apaixonar-se pela ciência do solo, diz ela, é resultado de uma série de fatores que vão desde o contato na infância até um professor qualificado que encanta seus alunos e os faz enxergar os desafios e riquezas de dedicar-se à ciência do solo.
É fato que muitas mulheres que optam por entrar em um mercado de trabalho mais masculino enfrentam preconceito, pelo menos inicialmente. “A mulher sempre terá que provar sua competência, e isso não é ruim. Isso nos faz mais fortes. Os desafios são construtivos, nos movem. E isso é realmente um privilégio nosso, fruto da nossa vontade. Para sermos reconhecidos (homens e mulheres) nos dias atuais, em que a informação chega sem fronteiras, temos que ser competentes e a competência exige uma boa formação. A formação envolve valores familiares e uma escola de qualidade. Assim conseguiremos, homens e mulheres, ser reconhecidos como bons profissionais”, afirma a professora.
Mariângela Hungria
Mônica Costa
“Microbiologia do solo é pra mulher”
A pesquisadora da Embrapa, Mariangela Hungria, Membro da Academia Brasileira de Ciências, e que já presidiu a Sociedade Brasileira da Ciência do Solo (SBCS), relata sua primeira experiência como mulher no XVIII CBCS, em 1981, em Salvador , como mestranda, onde pouquíssimas mulheres participaram.
“Eu já estava acostumada com isso pela escolha da graduação em Agronomia, mas esperava que o ambiente científico fosse um pouco mais aberto. E lá estávamos nós, sempre com as piadinhas dos colegas, no meu caso, ainda associando que para microbiologia, que é coisa delicada, mulher serve….”, conta Mariangela.
Segundo ela, nada disso importou porque, na primeira apresentação oral de minha vida, a coordenadora da mesa, levantou o maior debate na apresentação do seu trabalho. “Admirei aquele raciocínio brilhante da mulher que me incentivava a continuar na pesquisa, e vi que podíamos ser poucas, mas que havia espaço para sermos brilhantes”, acrescenta.
E com o tempo, esta visão se concretizou, segundo Mariangela. “Hoje vejo pesquisadoras, professoras e alunas cada vez em maior número, cada vez mais brilhantes, em trabalhos publicados na Revista Brasileira de Ciência do Solo, em reuniões e congressos da SBCS.
Mariangela foi a primeira mulher presidente da SBCS, no período de 2001-2003. “Já sem piadinhas, sem sofrer preconceito, já havíamos conquistado nosso espaço em duas décadas. Para o futuro, vislumbro que logo a porcentagem de mulheres pode ultrapassar a de homens na sociedade, mas o mais importante é que isso já não importa. Somos todos considerados pesquisadores, professores, cientistas do solo, independente do gênero”, pondera.
Sobre a área de microbiologia do solo eram “poucas” batalhando para o reconhecimento das pesquisas, que em geral eram vistas como “cosméticos” do solo, sem grandes impactos nas demais “linhas nobres”.
E foi então que as coisas foram mudando, o reconhecimento e a participação da microbiologia foram aumentando. Hoje já não há dúvidas de que a microbiologia tem um impacto enorme na fertilidade do solo, bem como em todas as demais áreas da ciência do solo.
Para o futuro, a pesquisadora da Embrapa, vislumbra uma SBCS mais holística, justamente pelo entendimento de que é o todo e não as partes que precisa ser estudado e compreendido. “Acredito que a SBCS terá um papel cada vez mais marcante, com embasamento suficiente nas pesquisas multidisciplinares para permitir posicionamentos seguros e propostas para políticas governamentais”.
Para Arnaldo Colozzi, diretor do Nucleo Paraná da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo-NEPAR, hoje as mulheres ocupam papel de destaque na pesquisa e no ensino sobre solos no Paraná. Na maioria das universidades paranaenses e instituições de pesquisa existem mulheres na coordenação de departamentos e cursos de graduação e pós, de programas e projetos de pesquisa científicos, de atividades de difusão, transferência de tecnologias e divulgação da ciência. Segundo Colozzi, as mulheres hoje ocupam espaços importantes e dão grande contribuição na área de solos e de formação de pessoal. “Além de muito preparadas, as mulheres humanizam o ambiente de trabalho, contribuindo para a criatividade e a produtividade”, afirmou.